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Quando o amor foi bem vivido, nenhum adeus é eterno!

O luto pode ser uma luta tenebrosa no início da perda... mas a saudade de um amor bem vivido se transforma, aos poucos, numa espera pacífica e incrivelmente amorosa!

Me lembro bem: quando meu pai faleceu, em 2008, os momentos logo após a morte dele me deixaram praticamente anestesiada: durante o velório eu estava bem: fazia cafuné nos cabelinhos dele, olhava muito nos olhos dele e me lembrava de tudo o que tínhamos vivido juntos. Fiquei lá por horas e horas orando, lembrando, refletindo, observando. E estava bem! Parecia que a ficha só caía quando eu despertava do leve sono durante a madrugada, e aí quando acordava logo pensava: “Tomara que seja mentira, tomara que seja mentira!” Mas não era… então por alguns minutos me batia muita tristeza, eu chorava, mas logo já estava anestesiada novamente! E isso se repetiu por algumas vezes.

 

Passado o velório, veio o que eu achava que seria a parte mais difícil de todas desse momento: o enterro. A imagem de tudo se fechando e uma vida, uma das mais importantes pra mim, estar sumindo igual areia ao vento, na minha frente! Isso efetivamente parecia bastante pesado de se aguentar no coração! Mas acabou não sendo! Ver meus irmãos e parentes com orgulho carregando-o pelo velório apagou essa imagem que eu tinha do que seria o momento, transformando-o num dos momentos mais lindos que lembro da minha vida! Sim, eu sei que pode ser forte essa afirmação, mas foi lindo! Então pronto!

 

Bom… passou-se então o momento da perda imediata… passou o velório… passou o enterro! E foi aí que pensei: “Acho que até que consegui superar bem!” Era a minha primeira grande perda dessa vida.

 

Mas eis que veio o que ninguém alerta e ninguém nos diz sobre as perdas. A volta à vida normal sem a pessoa amada, que dividiu durante décadas esses momentos conosco!

 

Durante o velório e o enterro, você fica rodeado de muita gente querida, e querendo ou não, ainda sente a presença da pessoa que se foi: ela está ali, ao seu lado! O corpo físico está lá, seus olhos conseguem ver! É tudo natural.

 

Alguns poucos dias após o enterro do meu pai, que foi em Atibaia, eu voltei para minha vida normal em São Paulo. Enquanto estava em Atibaia, superei tudo muito bem. Meu pai viveu ali seus últimos anos… minha mãe estava ali… meus irmãos! Então tudo era bem familiar. Mas lembro que ao voltar para São Paulo, minha cabeça pirou de uma forma que não imaginava. Muitos dizem que o local ou as coisas de quem partiu podem atormentar e paralisar quem ficou… tudo te lembra a pessoa. Mas no meu caso foi exatamente o contrário: quando voltei para onde eu morava, absolutamente nada me lembrava meu pai. O apto era só meu, as coisas eram só minhas, os momentos aqui eram meus. A minha vida compartilhada com meu pai estava lá, e eu tinha ido embora. Naquele momento em que entrei com o carro na Marginal em São Paulo, ali tudo mudou, e a dor que eu estava achando que tinha superado bem, veio como um machado no meu coração.

 

Me lembro de ter chorado muito quando entrei no apartamento, e tudo o que eu queria era voltar… nos dias de trabalho, me peguei muitas vezes chorando do nada, olhando para o computador ou ouvindo um cliente; era qualquer coisa a qualquer hora, e batia aquela tristeza, aquele vazio. Eu me perguntava: “Onde está meu pai? Não o vejo em nada aqui!” Que desespero silencioso e completamente solitário eu sentia.

 

Foi então que começaram as vir os sonhos: no primeiro deles, meu pai me ligava no meu trabalho (inclusive o trabalho em que estou ainda hoje) e me falava: “Ce (ele me chamava assim), preciso ser rápido pois tive uma concessão muito rápida para falar com você: meu único recado é para que você viva o hoje. Não se prenda nem ao passado e nem ao futuro… viva o hoje! O hoje é o que você tem e que precisa ser vivido. O resto é só resto!” Foi incrível, acordei rapidamente e sentia que tudo era tão real. E foi, tenho certeza!

 

No segundo sonho a gente se encontrava no Museu do Ipiranga, aqui em São Paulo, e a gente corria um em direção ao outro, e ele me pegava e me rodava pelos braços, com um lindo sol brilhando em toda a cena. Não nos falamos, nada foi ouvido, a não ser as batidas do meu coração em pleno vapor. Acordei e me senti abraçada, consolada, em paz! Foi real, eu sei!

 

Tenho vários outros sonhos anotados no meu caderninho onde registrei cada segundo de vida após a partida dele, mas esses dois primeiros eu lembro como se fossem ontem de tão fortes que foram pra mim em sentido real!

 

O luto é sempre um processo muito difícil para o ser humano, muito desafiador. Mas quando se tem alguma espiritualidade acesa no coração, isso pode ser um fator determinante de como a perda será encarada a partir dos primeiros momentos.

 

Hoje, 2023, quinze anos já se passaram. Semana passada sonhei com ele… foi forte, um sonho cheio de sinais e recados para a minha vida atual. Quinze anos depois. Como pode?!

 

Ainda ontem estava com meu filho de 4 anos ouvindo músicas do Balão Mágico. Quando começou a tocar “Dia dos Pais”, chorei de soluçar de tanta saudade:

 

Amigo velhoEu queria falarMeu velho amigoFoi tão bom te encontrarAmigo velhoEu te amo demaisMeu velho amigoTodo diaÉ dos pais

 

O luto é sim uma luta tenebrosa no início da perda… mas a saudade de um amor bem vivido se transforma, aos poucos, numa espera pacífica e incrivelmente amorosa. Desde a perda do meu pai eu costumo dizer que quando o amor foi bem vivido, nenhum adeus é eterno. Isso porque eu sinto muito forte, dentro de mim, que vamos nos encontrar. E isso não tem absolutamente nada a ver com religião… até porque, tenho estudado tanto sobre espiritualidade que nem sei mais em qual religião acredito. Aliás, acho mesmo que não acredito mais em nada de religião, eu vivo Deus ou uma energia maior dentro de mim. Não se trata de fé… trata-se de um sentimento forte que carrego comigo todos os dias.

 

Eu imagino, inclusive, como será o nosso reencontro quando chegar a minha hora de partir: vejo nitidamente meu pai chegando num carro grande, estilo kombi, toda colorida e cheia de adesivos, com uma buzina enorme e barulhenta e um som altíssimo e animado tocando (ele adorava Rhythm Is a Dancer, do Snap). Com ele virá também meu cachorrinho “Amigo”, que partiu desse mundo com quatro meses, era minha alma gêmea canina… hoje em dia imagino que na Kombi estará também meu sogro Arnaldo, que faleceu há pouco menos de dois anos. Todos virão me buscar, e a gente seguirá para algum lugar, sei lá qual, animados e fazendo uma tremenda bagunça pelo caminho.

 

O que me faz ter essa certeza? Provavelmente o amor bem vivido nessa vida. O amor que nos é dado na infância e numa vida toda durante 30 anos pode fincar certezas em nossa alma mais do que qualquer fé ou religião! Um amor bem vivido fortalece, semeia certezas num mundo cheio de dúvidas, constrói uma fortaleza de alma dentro de um corpo físico tão fraquinho e desprovido de armaduras!

 

Eu não tenho dúvidas: o amor que vivi por meu pai e que ele me devolveu durante 30 anos transformou o adeus da sua partida em um simples até breve! Meu pai não foi embora! Porque quem amamos nunca morre! Apenas parte antes de nós!

 

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