Os que amamos nunca morrem – Capítulo III
E depois de anos e anos de felicidade e cumplicidade, vieram os últimos capítulos da nossa vivência juntos... nesse mundo!
Aqui começam alguns relatos de um diário que fiz alguns dias depois do falecimento do meu Querido Pai.
5ª feira, 31/07/2008…
Naquela 5ª feira larguei o trabalho, após receber uma ligação da minha irmã Silvia dizendo que ele não estava bem. Era meio-dia quando deixei São Paulo rumo à Atibaia, sem falar com ninguém na empresa.
Chegando lá vi meu pai fraquinho. Ele foi liberado do hospital, e fomos pra casa. Passei a tarde toda com ele, ajudando-o a comer. Foi um momento mais do que marcante em minha vida: me sentei ao lado dele enquanto passava Chapolin na TV, olhei para a janela – estava um sol lindíssimo lá fora – e pensei:
“Largaria toda a minha vida nesse momento para ficar com esse cara, ajudando-o em tudo o que fosse preciso. Acho que isso é amar!”
Conversei com ele sobre sonhos, saudades… ele disse que tinha vontade de ir à praia, para brincar com as ondas. Também falamos sobre passarinhos, sobre o brilho do sol.
À noite os outros irmãos chegaram.
Lygia cortou o cabelinho dele, e lembro-me de ouvi-lo falando que confiava nela.
Silvinha, Ju e Serginho tentaram fazê-lo andar. Ele chorou quando todos batemos palmas por ele ter conseguido. E aí choramos todos depois, cada um no seu cantinho.
Alguns indícios tivemos de que ele estava vendo o seu pai (ídolo dele) no quarto.
Voltei para São Paulo para trabalhar no dia seguinte.
6ª feira, 01/08/2008…
Saí direto do trabalho e fui de volta para Atibaia.
Ele já estava com olhar distante de nós… lembro-me de ver meu cunhado, Nilo, olhando fixamente pra ele, como se estivesse se despedindo.
Eu, Silvinha e Me (minha mãe), ficamos ao lado dele, conversando, dando água pra ele se sentir melhor. O sentimento de família era absurdo! Inundava! O mundo lá fora não existia mais!
Fui dormir e disse a ele que às 7h estaria de pé para ser a enfermeira durante o dia. Ele mexeu a sobrancelha, sorriu. E Me completou: “Tá vendo? Tudo o que você queria: os filhos lambendo o pai!”. E de novo ele sorriu.
Dormi bem… nada de mal iria acontecer, eu acreditava nisso!
Sábado, 02/08/2008…
Às 7h30 eu acordei e fui direto vê-lo. Não estava bem, sentia dificuldades para respirar, para se levantar. Mas nada de mal iria acontecer, eu continuava acreditando!
O deixamos na varanda para sentir o sol.
Me foi tomar café, e eu fiquei com ele fazendo companhia. Fiz massagem nas costas dele. E num instante pensei que seria melhor levá-lo ao médico. Pedi à Me para ligar, e ela chorou com meu pedido, enquanto buscava o número do telefone do médico.
Carregado no colo, todos entramos no carro.
Entre uma marcha e outra, agarrava a mãozinha dele tentando transmitir paz, segurança, sentimento de família que ele sempre nos ensinou e passou sua vida nos dedicando!
Me falavam para eu ficar preparada pois achavam que ele seria internado. E eu rebatia, dizendo que não, que nada de mal iria acontecer! Eu acreditava, ainda!
Estava muito tranquila… sorridente! Em paz!
Me bateu uma fome, comecei a comer uma trufa de chocolate que eu tinha na bolsa, e depois do 1º pedaço, um médico chamou na sala de recepção: “Sérgio Joaquim de Almeida!!!”
E eu achei muito estranho, porque meu pai estava lá dentro, como ele não sabia disso?! Joguei a trufa e fui lá dentro, passando por todo mundo para ver o que estava acontecendo.
Quando entrei, alguns médicos discutiam sem sabe o que meu pai tinha. Isso tudo na frente dele, sem o menor tato. Fiquei triste, com raiva, e fui lá ficar com ele mesmo sem poder. Agarrei a mão dele, fiz cafuné nos cabelinhos, e falei: “Fica tranquilo que tudo vai dar certo, nós estamos aqui com você.” Minha mãe estava a minha frente, conversando com uma médica.
Ele segurou muito forte minha mão, e eis que começou a olha para trás de mim, virando o pescoço, como se estivesse acompanhando alguém andando atrás de mim. E então a máscara de ar caiu, e ele abriu muito os olhos, atento, continuando a acompanhar alguém por trás de mim que eu procurava e não encontrava, não conseguia enxergar. Foi então que o barulho da batida do coração deu o alerta na máquina, e todos correram, mandando minha mãe e eu sairmos.
Eu e minha mãe nos abraçávamos, e depois descobrimos que ambas praticaram nessa hora o AMOR na sua forma mais pura e completa: ambas rezamos para ele não voltar, pois não queríamos vê-lo sofrendo numa cama de hospital. Eu lembro que pensava nele e mentalizava:
“Não precisa voltar por nós… vá ser feliz, vá encontrar o seu pai, pois daqui a pouco nós todos estaremos aí com você! Seja feliz, como sempre nos ensinou a ser!”
Foi quando vimos uma médica nos acenando de forma negativa, nos mostrando que ele já tinha partido e que as massagens cardíacas não fizeram efeito.
Não sei dizer o que senti nesse momento… foi um misto de tristeza, de abismo, com felicidade, alívio, fé em algo maior!
Meu pai finalmente poderia ser novamente quem ele sempre foi, livre!!!
Lembro de algumas horas depois ter conversado com minha amiga Grace (aquela mesma que citei linhas acima e que hoje está com ele no céu), e ela me dizia inconformada: “Eu poderia imaginar qualquer pessoa morrendo, menos alguém da sua família, que sempre seria eterna pra nós que acompanhávamos toda essa trajetória feliz de vocês”. Sé fez as orações do casamento dela… ela gostava demais dele, o admirava muito!
Contei para meus irmãos… foi um choque!
Quando contei para minha ex-cunhada, ela disse que já sabia desde o dia anterior, pois na noite de 6ª, quando foi visitá-lo, ela viu anjos brancos e muito altos, dançando ao redor dele como numa roda, já num ato de levá-lo para cima. Fiquei chocada quando ouvi, e ao mesmo tempo, muito feliz!
Minha irmã Silvia me disse que nessa mesma noite, olhando fixamente para os olhos dele, sentiu que ele perguntava a ela se poderia partir. Sem falar uma palavra… e ela só respondeu a ele “Sim”. E chorou!
Meus irmãos Jú e Serginho chegaram tranquilos… me deu muita força vê-los serenos, em paz, sem desespero. Senti que era possível fazer algo diferente, e que podíamos ter fé de que tudo estava bem.
Me e Adriano (meu ex-cunhado) nos ajudavam a cuidar de todos os trâmites.
Ly estava muito triste, conversávamos muito. Ninguém acreditava no que tinha acontecido, tudo tão rápido.
Meu amigo Dé me ligou, chorava muito. E dividia comigo o momento numa sintonia que só amigos verdadeiros conseguem alcançar. Ele veio com Dannycas, minha amiga, no velório em Atibaia. Foi muito bom tê-los por lá o tempo todo.
A cada ligação que Me fazia para os amigos e familiares, chorava um pouco de emoção. E lembro-me dela dizer sempre: “Sé fez a Páscoa”.
Todos fomos almoçar juntos em casa. Eu, Me, Serginho e Carina ficamos por alguns momentos no quartinho relembrando vários bons momentos da família unida… todos deitados, sentados, durante duas horas relembrando. Foi um momento único, muito gostoso! Uma paz enorme!!!
Para conferir o capítulo anterior a este, clique em https://blog.bleev.online/2023/01/08/os-que-amamos-nunca-morrem-capitulo-ii/
O capítulo IV desta história (muito mais de vida do que de morte) tratará do momento difícil, mas importante, da despedida de quem amamos. Não percam!!!